sábado, 5 de maio de 2007

Prólogo

Muitas crianças e adolescentes quando se matriculam em alguma escolinha esportiva já chegam com uma concepção de esporte. Essa concepção é a reprodução do esporte vivido até então pelos mesmos, no “campinho” do bairro ou na quadra da escola. O interessante é que esse esporte praticado na comunidade já é uma reprodução de um outro esporte incrementado a partir de um fazer prático não significativo e de pouca ou nenhuma reflexão teórica, o “fazer pelo fazer”, embasado em uma referência de aptidão física, que aliada à “performance esportiva”, contribui para a idéia de que trabalhadores bem preparados fisicamente produzem mais e melhor.

Ainda hoje, muitos professores acreditam que o ensino do esporte reduzido ao esquema de aquecimento, fundamento e jogo contribuem para a socialização do educando. Que a criança e o adolescente, através do esporte, aprendem que entre eles e o mundo existem os outros, aprendem a conviver com vitórias e derrotas, aprendem a vencer através do esforço pessoal, desenvolvem a independência e a confiança em si mesmos, o sentido de responsabilidade, etc. Essas afirmações exaltam os aspectos positivo-funcionais camuflando os disfuncionais.

No entanto, através do esporte podemos relatar os aspectos disfuncionais, ou seja, pelas regras, o esporte imprime a concorrência e a competição. As condições do esporte de rendimento são de uma sociedade autoritária. Nessa direção, o ensino do esporte enfatiza o caráter incontestável das regras, levando ao acomodamento – posicionamento que está em discordância com os objetivos e princípios da Educação.

Esses educandos que ingressam trazem uma visão de sociedade competitiva - a partir do esporte vivido até então – na qual o principio de rendimento se impôs. Dessa forma, talvez por uma consciência ingênua, seus educadores esportivos anteriores pretendiam integrá-los na sociedade (uma sociedade capitalista, onde o esporte e a educação são funções do sistema, mantendo a estabilidade como unidade de funcionamento. Quem nunca ouviu um professor dizendo: “ A vida lá fora é assim, não adianta querer mudar.”), porém esse processo de socialização não é neutro, pois ele se dá dentro de um contexto de valores específicos de uma classe dominante e reforça a idéia que os valores dessa classe devem ser aceitos como normais e desejáveis. Ou seja, a dominação e a exploração devem ser consentidas e assumidas por todos de forma natural.

O esporte enquanto fim em si mesmo, está carregado de atitudes, normas e valores relacionados com sistemas mais amplos que se estendem para além da situação imediata do esporte. No esporte desenvolvem-se idéias e valores que levam ao conformismo, coloca-se a idéia de que todos têm a oportunidade de vencer e que desaparecem as desigualdades.

Esse esporte educa para a adaptação à sociedade capitalista e não privilegia a consciência crítica, a sensibilidade e à realidade que o envolve.

O presente projeto espera poder contribuir para a transformação desse esporte, através do aprendizado consciente das normas sociais e, se necessário de maneira livre e espontânea, saber e poder modificá-las. Nesta concepção toma-se uma decisão livre e consciente pelo estudo das regras, tendo em vista a conscientização do processo de regulamentação, isto é, o caminho pelo qual as regras são instituídas, discutidas e combinadas.


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