segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Educação Física: objeto de estudo e importância no desenvolvimento humano

Educação Física: objeto de estudo e importância no desenvolvimento humano

Edilson Ferreira Gonçalves - PEI/UNISINOS

A área da Educação Física e seus objetos de estudo vêm sendo analisados por diversos autores nas últimas décadas. Segundo Bracht (1996) o ”objeto“ da Educação Física, ou seja, sua especificidade, é fundamentalmente a prática pedagógica. Gamboa, citado por Bracht (1996) entende que “a Educação Física, assim como a Pedagogia, estariam situadas em novos campos epistemológicos, cuja característica especifica seria exatamente a dimensão da ação (intervenção)”, para esse autor, a “EF seria então, uma ciência da e para ação”. O objeto da EF é um saber específico, uma tarefa pedagógica específica, cujo processo de ensino/aprendizagem é atribuído a esse espaço pedagógico: a Educação Física.

As várias denominações que surgiram ao longo do tempo para identificar o objeto de estudo da Educação Física, como ciência que trata da aptidão física, dos exercícios físicos, conferiu a ela características que a reconheciam a partir de uma proposta biologicista, onde o desenvolvimento físico e motor (aptidão física), era entendido como capaz de promover uma educação integral do ser humano, sem dar, porém, significado a ações culturalmente produzidas ao longo da história.

Outra concepção de Educação Física passou a vigorar com a absorção do discurso da aprendizagem motora, do desenvolvimento motor e da psicomotricidade. Passou-se a privilegiar o movimento humano como base para o desenvolvimento integral, promovendo uma educação do e pelo movimento. Nessa abordagem desenvolvimentista o movimento repercute sobre a cognição e a afetividade, “dos diversos arranjos/tarefas motoras para garantir o desenvolvimento das habilidades motoras básicas, com repercussões sobre os domínios cognitivo e afetivo-social” (BRACHT, 1996).

Podemos afirmar que as duas propostas analisadas (biologicista e desenvolvimentista) são despolitizadas. Apesar de levar em conta o contexto social em que os sujeitos estão inseridos, isso não é suficiente para politizar suas intervenções. Entendendo que uma educação integral deva contemplar todas as dimensões do ser humano, entre elas a política – num sentido de reflexão sobre o processo de negociação nas relações sociais – a educação física passou a ter uma postura mais crítica, como veremos.

A cultura corporal[1] passou a ser defendida como objeto de estudo da Educação Física, em 1992, quando um coletivo de autores passou a defender uma proposta critica-superadora que possibilitasse interpretar e estabelecer relações entre significado/intenção e homem/sociedade com possíveis mudanças sociais, do ponto de vista da classe trabalhadora. “Esta abordagem levanta questões de poder, interesse, esforço e contestação. Acredita que qualquer consideração sobre a pedagogia mais apropriada deve versar, não somente sobre questões de como ensinar, mas também sobre como se adquiri estes conhecimentos, valorizando a questão da contextualização dos fatos e do resgate histórico” (DARIDO, 2001). Essa abordagem tem um sentido político pedagógico. Político porque encaminha propostas de intervenção em determinada direção e pedagógico no sentido de que possibilita uma reflexão sobre a ação dos homens na realidade, explicitando suas determinações.

Já outra abordagem denominada crítico-emancipatória, cujo autor referência é Elenor Kunz, trata da transformação didático-pedagógica do esporte (título de um dos seus livros). Nessa concepção o ensino deve libertar de falsas ilusões, de falsos interesses e desejos, criados e construídos nos alunos pela visão de mundo que apresentam a partir do conhecimento. Utilizando-se da linguagem como expressão de entendimento do mundo social, fazem com que todos possam participar nas decisões, interesses e preferências, “de acordo com as situações e condições do grupo em que está inserido e do trabalho no esforço de conhecer, desenvolver e apropriar-se de cultura” (DARIDO, 2001).

Ao refletirmos sobre as abordagens aqui citadas, mesmo que de maneira superficial, verificamos o quão próximo da realidade elas se encontram no nosso cotidiano, se vinculando em uma totalidade teórica. Ora, uma teoria não anula a outra, pelo contrário, elas veiculam saberes construídos que auxiliam no entendimento do patrimônio pedagógico da Educação Física. Em um certo momento histórico o movimento em si bastava para atingir os objetivos da Educação Física. Atualmente esses objetivos são maiores, e somamos ao movimento a intenção (pedagógica e social) do desenvolvimento humano. Isso significa uma ação voltada para o desenvolvimento integral do educando, abrangendo suas dimensões cognitiva e instrumental, juntamente com os componentes éticos, afetivos, físicos e espirituais.

Uma visão de corpo na educação

Nesse item, desejo fazer breve comentário sobre a importância do corpo para a educação integral. Acreditamos que a educação pela via do corpo é mais significativa para o educando, pois encarnar idéias, sentimentos, imagens e emoções, é educar para a plenitude do sujeito.

Segundo a educação racionalista, fundamentada por Descartes (1596-1650), podemos falar em educação corporal e em educação intelectual, corpo e mente, “um mundo dos objetos, relevante para o conhecimento objetivo, e outro, do sujeito, um mundo intuitivo, reflexivo, que conhece de outra forma” (MORAES, 2004) De um lado está o espírito, a alma. Do outro, a matéria, as ciências. Esse pensamento racional afirmou que para se chegar a um conhecimento era preciso decompor a questão em outras mais fáceis até chegar a uma resposta evidente. O pensamento cartesiano reconheceu a superioridade da mente em relação ao corpo e concluiu que eram coisas separadas. A educação intelectual objetivava a razão como essência libertadora do ser humano. O corpo era elemento perturbador que precisava ser “educado” rigorosamente.

Para Bracht (1999), na sua maioria, as teorias de ensino e aprendizagem são desencarnadas, “é o intelecto que aprende” (p.71). O corpo é historicamente negligenciado pela educação. No entanto, segundo o autor, hoje há um “movimento no sentido de recuperar a dignidade do corpo no que diz respeito aos processos de aprendizagem” (p.71).

Moraes (2004) afirma que “matéria e mente são aspectos diferentes e inseparáveis de um mesmo conjunto”. O individuo constrói o conhecimento não apenas pelo uso do raciocínio e da percepção, mas sobretudo, pelas sensações e emoções. Encarnamos uma totalidade corpo e mente.

Para Teixeira (2004), “o corpo é parte inseparável no processo pedagógico”, onde o sujeito “é entendido em sua totalidade, onde o corpo e a mente se integram na construção do conhecimento”. Conforme Santos (apud Teixeira, 2004) o entendimento da amplitude da dimensão humana, deve partir da “concretude biológica do corpo humano, avança no conhecimento, analisando as inter-relações dos aspectos antropológicos (culturais), psicológicos, sociais, políticos, educacionais e filosóficos que envolvem esse corpo”.

Segundo Bracht (1999), o corpo assume papéis segundo as exigências sociais: corpo produtivo (necessidades produtivas), corpo saudável (necessidade sanitárias), corpo deserotizado (necessidades morais) e corpo dócil (necessidade de adaptação e controle social). Assim, o corpo precisa “ser alvo de educação, mesmo porque educação corporal é educação do comportamento humano que, por sua vez, não é corporal, e sim humano. Educar o comportamento corporal é educar o comportamento humano” (BRACHT, p.72).

Partindo do pressuposto que o corpo é indissociável do processo pedagógico, ele próprio, a partir das relações sócio-culturais, se constrói. Na perspectiva de uma educação integral, é importante conceber esse e por esse corpo um meio de reflexão da época em que vivemos. Fenômeno social que é, o corpo reflete a própria sociedade que se insere, entrelaçando suas histórias.

O corpo, totalidade indivisível, ser humano, é assim um ser de relações, cuja identidade é construída mediante interações com o mundo. É um ser contextualizado, original, singular, diferente e único. Porém inconcluso, inacabado, e conforme Moraes (2004, p.167) “necessita se educar permanentemente, desenvolvendo-se em direção a maturidade não apenas no crescimento físico, mas, sobretudo, num crescimento interior qualitativo e multidimensional, uma vez que todos os aspectos que o compõe se influenciam mutuamente. Um indivíduo que precisa sobreviver num mundo em conflito, num contexto em contínua modificação de parâmetros e referências, um sujeito em busca de condições externas de sobrevivência, que se esquece de suas condições internas e do fato de que aquilo que o distingue, na realidade, é sua capacidade de consciências e de reflexão.”



[1] “A expressão corporal é tomada como linguagem, conhecimento universal, um patrimônio cultural humano que deve ser transmitido aos alunos e por eles assimilado a fim de que possam compreender a realidade dentro de uma visão de totalidade, como algo dinâmico e carente de transformações.” (SOARES, 1992, p.42)

BRACH, Valter. Educação Física no 1º grau: Conhecimento e Especificidade. Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, supl.2, p.23-28, 1996

BRACH, Valter. A constituição das teorias pedagógicas da educação física. Cadernos Cedes, ano XIX, nº 48, Agosto/99

DARIDO, Suraya Cristina. Os conteúdos da Educação Física escolar: influências, tendências, dificuldades e possibilidades. Perspectivas em Educação Física Escolar, Niterói, v2, n.1 (suplemento), 2001.

MORAES, Maria Cândida. O paradigma educional emergente. Campinas: Papirus, 2004.

SOARES Carmem Lúcia. et al. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992.

TEIXEIRA, Juciane. Jogos Esportivos como Estratégia para o Desenvolvimento Integral de Crianças e Adolescentes. 2004. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação). Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2004.

Paradigma do Desenvolvimento Humano

Até o final da década de 80, o avanço de uma população era medido pela sua dimensão econômica através do PIB (Produto Interno Bruto) per capita, ou seja, todas as riquezas produzidas por essa população (em valores financeiros) dividido pelo número de pessoas dessa população. O que se obtém nessa divisão é um valor médio, supostamente atribuído a uma qualidade de vida individual da população. Por exemplo, o PIB per capita do Brasil em 2003 era de R$ 8.694,00 , o que corresponde à renda individual de cada brasileiro naquele ano.
A partir de 1990 a elaboração do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) faz um contraponto ao PIB. Além do PIB per capita, o IDH leva em consideração a longevidade e a educação de uma população. A ampliação do conceito de desenvolvimento humano para além do puramente econômico abrangendo agora as dimensões sociais, culturais e políticas que influenciam a qualidade de vida humana é o que caracteriza essa nova abordagem de medida do desenvolvimento e a que chamamos de Paradigma do Desenvolvimento Humano (PDH).
A transição de um paradigma para outro é, segundo Thomas Kuhn, a reformulação do campo temático de uma área de conhecimento a partir de novos fundamentos. Trata-se de uma reconstrução que muda algumas das generalizações mais básicas e elementares de uma disciplina, assim como muitos dos seus métodos e aplicações. A transformação da teoria de desenvolvimento humano experimentado na década de 90 pode ser considerada como uma mudança de paradigma.
Os fundamentos de desenvolvimento do PIB são bastante conhecidos (produto financeiro do mercado de bens e serviços do país) e os do novo paradigma ainda são relativamente recentes e pouco difundidos. Assim a questão que se coloca é: quais são as crenças, valores e noções básicas que orientam esse novo paradigma?
Segundo o Instituto Ayrton Senna (IAS) o PDH pode ser resumido em 12 princípios:
1. A vida é o mais básico e universal dos valores;
2. Nenhuma vida humana vale mais do que a outra;
3. Toda pessoa nasce com um potencial e tem o direito de desenvolvê-lo;
4. Para desenvolver o seu potencial, as pessoas precisam de oportunidades;
5. O que uma pessoa se torna ao longo da vida deponde de duas coisas: das oportunidades que teve e das escolhas que fez;
6. Além de ter oportunidades, as pessoas precisam ser preparadas para fazer escolhas;
7. Cada geração deve legar para as gerações vindouras um meio ambiente igual ou melhor do que aquele recebido das gerações anteriores;
8. As pessoas, as organizações, as comunidades e as sociedades devem ser dotadas de poder para participar nas decisões que as afetem;
9. A promoção e a defesa dos direitos humanos são o caminho para a construção de uma vida digna para todos;
10. O exercício consciente da cidadania é a melhor forma de fazer os direitos humanos transitarem da intenção à realidade
11. A política de desenvolvimento deve basear-se em quatro pilares: liberdades democráticas, transformação produtiva, equidade social e sustentabilidade ambiental;
12. A ética necessária para pôr em prática o Paradigma do Desenvolvimento humano é a ética da co-responsabilidade.

Um desafio para educadores é erigir um conceito de educação que seja capaz de corresponder às complexas exigências ético-políticas dessa nova visão de desenvolvimento humano.

Conteúdos de aprendizagem

A função que a sociedade historicamente tem atribuído a escola é de selecionar os melhores para uma carreira universitária. Essa atribuição tem sido a justificativa para a valorização de determinadas aprendizagens e a desvalorização de outras, dando pouco valor aos processos formativos, principalmente atitudinais, ao longo da etapa escolar.
Ainda hoje o papel atribuído à educação escolar valoriza as capacidades cognitivas que correspondem a aprendizagem numa perspectiva tradicional. No caso da Educação Física escolar essas capacidades cognitivas ficam em segundo plano, uma vez que essa disciplina prioriza aprender as técnicas, o “como fazer”, como veremos mais adiante.
Outra função que a sociedade determina à escola é a de formar o cidadão que constitui e contribui na configuração dessa sociedade. A partir dessa necessidade de formar o cidadão participante, a educação deve ter como objetivo despertar todo o potencial do ser humano, contribuindo na sua formação integral, partindo de uma profunda reflexão da condição de cidadão e as próprias características da sociedade de hoje e de amanhã. Surge aqui uma necessidade de posicionamento ideológico, uma vez que qualquer intervenção pedagógica nunca será neutra, ou seja, durante o ensino serão consideradas determinadas concepções de sociedade e de homem.
Para a formação integral devem-se aprender conteúdos de natureza variada. C. Coll propõe uma classificação para essa diversidade de conteúdos: conteúdos conceituais (o que se deve saber), procedimentais (o que se deve saber fazer) e atitudinais (como se deve ser).
Outra classificação é sugerida por Delors - UNESCO: a educação dever ser sustentada por quatro grandes pilares ou propostas: o aprender a conhecer (adquirir os instrumentos da compreensão), o aprender a fazer (como agir sobre o meio), o aprender a conviver (para participar e cooperar com os outros) e o aprender a ser (via essencial para integrar todos os pilares).
Se compararmos essas classificações como o ensino formal, perceberemos que acima de tudo é preciso aprender a conhecer (saber), em menor escala se necessita aprender a fazer, e que não é necessário aprender a conviver e ser, uma vez que esses conteúdos não são explicitados nos planos de ensino e que vem “à reboque” com as demais aprendizagens. Portanto, parece lógico concluir que para uma formação integral esses conteúdos devam ser contemplados de maneira equilibrada durante a escolarização.

Competência para quê?

Um dos grandes debates da Educação gira em torno das "competências". Há educadores e profissionais da área bem intencionados que sugerem que a educação escolar deve se pautar em desenvolver competências. Muitas ONG’s que trabalham com educação efetivamente se servem dessas competências para atingir seus objetivos educacionais. A discussão que quero abrir nesse post é para quê/quem serve tais competências.

Um aprofundamento nesse tema mostra que “Competência”, é um conceito falsamente progressista e relacionado à idéia de que os conhecimentos de cada um são fruto de experiências individuais, aparece como panacéia para os problemas pedagógicos atuais, mas de fato não faz mais que escamotear a submissão da educação escolar e popular à lógica do capital.

A educação de competências põe a ação educativa num nível de ajustamento e adequação ao real imediato, como se o aprender que não dissesse respeito à apropriação do conhecimento e do fazer da vida (as competências são capacidades gerais, relativas ao indivíduo flexível, moldável e acomodável às determinações e interesses da produção); além disso, se ajusta aos projetos de avaliação institucional, uma vez que, tomadas em sua singularidade abstrata, as competências não são mais que referências quantificáveis e controláveis (trata-se, portanto, de mensurar as performances individuais e produzir escalas de competência para classificar sujeitos e estabelecer condutas e procedimentos “pedagógicos”).

Tudo se projeta numa relação do sujeito com a informação, de modo que o mundo lhe é exterior e que toda a informação está disponível, bastando ser capaz de aprender. Esta lógica vai se impondo de forma cada vez mais violenta no sistema de educação, no sistema de produção, no sistema de consumo.

A questão que se levanta agora é: Vai-se à escola para adquirir conhecimentos ou para desenvolver competências?
Ressalta-se que o papel atual da epistemologia educacional, numa visão do mercado de trabalho, sai do mundo das idéias e cai na utilidade prática empobrecendo o valor da existência do Homem na dimensão dos conhecimentos e saberes.

Assim, com tais questões levantadas, cabe relembrar que se a busca é por umas sociedade mais justa, democrática, que efetivamente supere as diferenças de classes sociais, devemos procurar um projeto de educação para a transformação, que deve romper com o modelo de educação formal hegemônico, construindo alternativas de saber e de organização social.

sábado, 5 de maio de 2007

Prólogo

Muitas crianças e adolescentes quando se matriculam em alguma escolinha esportiva já chegam com uma concepção de esporte. Essa concepção é a reprodução do esporte vivido até então pelos mesmos, no “campinho” do bairro ou na quadra da escola. O interessante é que esse esporte praticado na comunidade já é uma reprodução de um outro esporte incrementado a partir de um fazer prático não significativo e de pouca ou nenhuma reflexão teórica, o “fazer pelo fazer”, embasado em uma referência de aptidão física, que aliada à “performance esportiva”, contribui para a idéia de que trabalhadores bem preparados fisicamente produzem mais e melhor.

Ainda hoje, muitos professores acreditam que o ensino do esporte reduzido ao esquema de aquecimento, fundamento e jogo contribuem para a socialização do educando. Que a criança e o adolescente, através do esporte, aprendem que entre eles e o mundo existem os outros, aprendem a conviver com vitórias e derrotas, aprendem a vencer através do esforço pessoal, desenvolvem a independência e a confiança em si mesmos, o sentido de responsabilidade, etc. Essas afirmações exaltam os aspectos positivo-funcionais camuflando os disfuncionais.

No entanto, através do esporte podemos relatar os aspectos disfuncionais, ou seja, pelas regras, o esporte imprime a concorrência e a competição. As condições do esporte de rendimento são de uma sociedade autoritária. Nessa direção, o ensino do esporte enfatiza o caráter incontestável das regras, levando ao acomodamento – posicionamento que está em discordância com os objetivos e princípios da Educação.

Esses educandos que ingressam trazem uma visão de sociedade competitiva - a partir do esporte vivido até então – na qual o principio de rendimento se impôs. Dessa forma, talvez por uma consciência ingênua, seus educadores esportivos anteriores pretendiam integrá-los na sociedade (uma sociedade capitalista, onde o esporte e a educação são funções do sistema, mantendo a estabilidade como unidade de funcionamento. Quem nunca ouviu um professor dizendo: “ A vida lá fora é assim, não adianta querer mudar.”), porém esse processo de socialização não é neutro, pois ele se dá dentro de um contexto de valores específicos de uma classe dominante e reforça a idéia que os valores dessa classe devem ser aceitos como normais e desejáveis. Ou seja, a dominação e a exploração devem ser consentidas e assumidas por todos de forma natural.

O esporte enquanto fim em si mesmo, está carregado de atitudes, normas e valores relacionados com sistemas mais amplos que se estendem para além da situação imediata do esporte. No esporte desenvolvem-se idéias e valores que levam ao conformismo, coloca-se a idéia de que todos têm a oportunidade de vencer e que desaparecem as desigualdades.

Esse esporte educa para a adaptação à sociedade capitalista e não privilegia a consciência crítica, a sensibilidade e à realidade que o envolve.

O presente projeto espera poder contribuir para a transformação desse esporte, através do aprendizado consciente das normas sociais e, se necessário de maneira livre e espontânea, saber e poder modificá-las. Nesta concepção toma-se uma decisão livre e consciente pelo estudo das regras, tendo em vista a conscientização do processo de regulamentação, isto é, o caminho pelo qual as regras são instituídas, discutidas e combinadas.


O jogo e os esportes

O jogo e os esportes se destacam como elementos de integração social, troca de conhecimentos, ampliação das possibilidades de convivência e instrumento educacional capaz de formar cidadãos críticos, participativos e cientes de seu papel na sociedade.

O jogo e o esporte, como instrumentos educacionais, devem contribuir para a construção de valores morais e éticos, coibindo a competição exacerbada e a conquista de resultados a qualquer custo.

Assim o foco da intencionalidade educativa do jogo deve apontar para o resgate de valores humanos, como amizade, cooperação, solidariedade e respeito.

Porém para alcançar tais objetivos o jogo e o esporte devem privilegiar o seu componente lúdico. Parece fácil concluir que um dos motivos que afastam algumas pessoas do esporte é a abordagem tecnicista dada a ele nos espaços educativos, onde se privilegia o aprendizado de habilidades motoras específicas do esporte.

Assim o nosso projeto prioriza o movimento possível, em oposição ao movimento ideal, respeitando a individualidade biopsicosocial do educando.

Cabe ao educador utilizar-se dos jogos não para reproduzir a cultura e os valores de uma sociedade desigual e opressora, mas para produzir conhecimento, valores e procedimentos que contemplem o ser humano de forma integral, contribuindo para a superação do paradigma de individualismo e corporativismo que resulta na acentuação das desigualdades sociais.


Para isso os jogos devem ser propostos a partir dos seguintes critérios:

- Possibilidade de participação de todos os alunos

- Possibilidade de sucesso de todos os alunos

- Permitir a gestão do jogo pelos educandos

- Favorecer adaptações e novas aprendizagens

- Manter a imprevisibilidade de resultados

A aprendizagem de determinadas competências cognitivas, produtivas, pessoais e relacionais é essencial na construção da autonomia intelectual e moral. Planejar a realização de uma tarefa, identificar formas de resolver um problema, saber formular boas perguntas e repostas, levantar hipóteses e buscar meios de verificá-las, validar raciocínios, saber resolver conflitos e cuidar da própria saúde, dentre outras situações, são procedimentos e atitudes que auxiliam os educandos a se tornarem protagonistas de sua própria aprendizagem.


Para educar atitudes e construir valores, é preciso criar um espaço de ajuda mútua, onde as competências pessoais e relacionas sejam tratadas como objeto de conhecimento. No espaço do jogo, poder discutir as regras e reconstruí-las com argumentos consistentes é crucial para a construção da moralidade autônoma.


Nessa perspectiva, cabe aos educandos, transformar o espaço do jogo num ambiente cooperativo, onde fazer escolhas, tomar decisões e resolver conflitos seja tarefa de todos, e não apenas de poucos. Assim desenvolvem-se aspectos relacionados à cidadania, como o dialogo, a discussão franca e objetiva, a análise das ponderações e idéias, de forma democrática e aberta, a tomada de decisão baseada no interesse e na necessidade da coletividade, sem imposição de atividades, mas respeitando e valorizando os conhecimentos e demandas dos educandos.


É na ação de jogar que o educando instrumentaliza-se e adquire competência para “jogar bem”. Ao professor cabe solicitar ao educando analisar, revisar, diferenciar, transferir e enriquecer seus esquemas de jogar cada vez melhor. Os segredos estão em lançar desafios nem muito fáceis, nem muito difíceis, mas de possível resolução, mesmo que, para isso, seja preciso a ajuda dos colegas e/ou professor.


Nos jogos não basta fazer, é preciso compreender. Fazer e compredender significam integrar as ações do intelecto com as da prática motora. O conhecimento do que é vivido corporalmente vem à consciência e pode ser imaginado e refletido, transformado e reconstruído a partir dos interesses e motivações dos educandos.


A verdadeira aprendizagem se dá através da ação do sujeito sobre os objetos de conhecimentos, sua posterior assimilação de formas e conteúdos deste objeto e a modificação do próprio sujeito.


É obvio a importância de ensinar o educando a aprender a aprender e a de ajudá-lo a compreender que, quando aprende, não deve levar em conta apenas o conteúdo objeto da aprendizagem, mas também como se organiza e atua para aprender.


Nesse blog, você vai encontrar atividades relacionados a aprendizagem de jogos e esportes que levam em consideração o exposto acima. Esperamos que você goste.